quinta-feira, julho 14, 2011

Por sobre o que Eu não sou há grandes pontes que um outro, só metade, quer passar. Um Outro que eu não posso acorrentar, nos versos de lamento de Mário Sá-Carneiro.



Ângulo

Aonde irei neste sem-fim perdido,
Neste mar oco de certezas mortas? -
Fingidas, afinal, todas as portas
Que no dique julguei ter construído...

- Barcaças dos meus ímpetos tigrados,
Que oceanos vos dormiram de Segredo?
Partiste-vos, transportes encantados,
De embate, em alma ao roxo, a que rochedo?...

Ó nau de festa, ó ruiva de aventura
Onde, em Champanhe, a minha ânsia ia,
Quebraste-vos também ou, porventura,
Fundasse a Ouro em portos de alquimia?...

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Chegaram à baía os galeões
Com as sete Princesas que morreram.
Regatas de luar não se correram...
As bandeiras velaram-se, orações...

Detive-me na ponte, debruçado,
Mas a ponte era falsa - e derradeira.
Segui no cais. O cais era abaulado,
Cais fingido sem mar à sua beira...

- Por sobre o que Eu não sou há grandes pontes
Que um outro, só metade, quer passar
Em miragens de falsos horizontes -
Um Outro que eu não posso acorrentar...

Mário de Sá-Carneiro
(1890-1916)

Mais sobe Mário de Sá-Carneiro em
http://pt.wikipedia.org/wiki/M%C3%A1rio_de_S%C3%A1-Carneiro

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