sábado, abril 09, 2011

No poema de Manoel de Barros, para o patrão Sebastião só servia para urubuzeiro. Mas um dia pegaram Sebastião a prosear em estrangeiro com os urubus.


O urubuzeiro

Meu amigo Sebastião estourou a infância dele e mais
duas pernas.
No mergulho contra uma pedra na Cacimba da Saúde.
Quarenta ano mais tarde Sebastião remava uma canoa
no rio Paraguaio.
E deu o barranco de uma charqueada.
Sebastião subiu o barranco se arrastando como um
caranquejo trôpego
Até a casa do patrão e pediu um trabalho.
O patrão olhou para aquele pedaço de pessoa e disse:
Você me serve para urubuzeiro.
(Urubuzeiro era tarefa de espantar os urubus que
atentavam nos tendais de carne).
Trabalho de Sebastião era espantar os urubus.
Sebastião espantava espantava espantava.
Os urubus voltavam de bandos.
Sebastião espantava espantava.
Um dia pegaram Sebastião a prosear em estrangeiro
com os urubus.
Chegou que Sebastião permitiu que os urubus
fizessem farra nas carnes.
Os urubus faziam farra e conversavam em estrangeiro
com Sebastião.
Veio o patrão e mandou Sebastião para o manicômio.
No manicômio ninguém compreendia a língua de
Sebastião.
De forma que Sebastião despencou do seu normal
E foi encontrado na rua falando sozinho em
estrangeiro.


Manoel de Barros
(1916)

Mais sobre Manoel de Barros em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Manoel_de_Barros

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