terça-feira, dezembro 02, 2008

O trabalho do amigo de Manoel de Barros era espantar urubus. O coitado foi parar no manicômio e saíu de lá falando sozinho em estrangeiro.


O urubuzeiro

Meu amigo Sebastião estourou a infância dele e mais
duas pernas
No mergulho contra uma pedra na Cacimba da Saúde.
Quarenta anos mais tarde Sebastião remava uma canoa
no rio Paraguaio
E deu o barranco de uma charqueada.
Sebastião subiu o barranco se arrastando como um
caranguejo trôpego
Até a casa do patrão e pediu um trabalho.
O patrão olhou para aquele pedaço de pessoa e disse:
Você me serve para urubuzeiro.
(Urubuzeiro era uma tarefa de espantar urubus que
atentavam nos tendais de carne.)
Trabalho de Sebastião era espantar os urubus.
Sebastião espantava espantava espantava.
Os urubus voltavam de bandos.
Sebastião espantava espantava.
Um dia pegaram Sebastião a prosear em estrangeiro
com os urubus.
Chegou que Sebastião permitiu que os urubus
fizessem farra nas carnes.
Os urubus faziam farra e conversavam em estrangeiro
com Sebastião.
Veio o patrão e mandou Sebastião para o manicômio.
No manicômio ninguém compreendia a língua de
Sebastião
De forma que Sebastião despencou do seu normal
E foi encontrado na rua falando sozinho em
estrangeiro.

Manoel de Barros

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Um comentário:

Murilo Rodrigues Guimarães disse...

Parabéns pelo lindo blog!
Tenho a ousadia de lhe apresentar meus próprios poemas: http://arquivomurilo.blogspot.com

A quem interessa poesia, que meus versos interessá-lo também possam!

Abraços,
Murilo.