quarta-feira, outubro 24, 2007

Eu que sou o rei de toda essa incoerência, não pude me vencer, mas posso-me esmagar. Vencer às vezes é o mesmo que tombar, diz em versos Sá-Carneiro.


A queda

E eu que sou o rei de toda essa incoerência,
Eu próprio turbilhão, anseio por fixá-la
E giro até partir... Mas tudo me resvala
Em bruma e sonolência.

Se acaso em minhas mãos fica um pedaço de oiro,
Volve-se logo falso... ao longe o arremeço...
Eu morro de desdém em frente dum tesoiro,
Morro à míngua de excesso.

Alteio-me na cor à força de quebranto,
Estendo os braços de alma - e nem um espasmo venço!...
Peneiro-me na sombra - em nada me condenso...
Agonias de luz eu vibro ainda entanto.

Não me pude vencer, mas posso-me esmagar,
-Vencer às vezes é o mesmo que tombar-
E como inda sou luz, num grande retrocesso,
Em raivas ideais ascendo até ao fim:
Olho do alto o gelo, ao gelo me arremesso...

Tombei...
E fico só esmagado por mim!

Mário de Sá-Carneiro
(1890=1016)

Mais sobre Mário de Sá-Carneiro em
http://pt.wikipedia.org/wiki/M%C3%A1rio_de_S%C3%A1-Carneiro

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